Já passou o tempo em que bastava fazer um produto ou serviço e colocá-lo no mercado para que os clientes aparecessem.
De uma concepção baseada no produto, passou-se a uma orientação para o cliente. Saber o que querem os clientes a qualquer hora, quais as suas preferências e os seus gostos são questões fundamentais para qualquer administrador. Mas poder antecipar-se ao que serão as necessidades latentes destes clientes é ainda mais importante e mais proveitoso para a empresa.
Existe um método que permite fazer isso mesmo e chama-se CEM - Concepção para Escuta do Mercado. Idealizado pelo professor japonês Shoji Shiba, “O CEM organiza o processo de concepção de um produto, ou de um serviço, a partir da operacionalização de uma matriz de expectativas recolhidas através de uma amostra representativa de clientes precursores/ pioneiros”.
O ponto de partida é bastante óbvio: um produto será considerado de qualidade se a sua concepção responder ao diagnóstico que dele fazem os seus clientes, atuais ou potenciais. Esta noção de escuta dos clientes, ou seja do esforço contínuo em aproximar cada vez mais a oferta de bens e serviços da empresa do que verdadeiramente interessa ao cliente, não pode ser desligado do conceito de Qualidade Total. É que a qualidade, em termos de ISO 9000 e de certificação, corresponde a dar ao cliente ao que ele pretende, nem mais nem menos. Consiste em satisfazer as suas expectativas. E para isso é necessário escutá-lo. O professor da universidade de Tsukuba estabeleceu um método para o conseguir.
Captar a voz dos clientes
Trata-se da fase inicial de todo o processo. Dela vai depender um bom desenvolvimento de toda a ação e os resultados e utilidade desta. Baseia-se na idéia que é necessário ir falar com os clientes. Não basta proceder a estudos analíticos, é também preciso visitar quem, de fato, vai, ou está utilizando os produtos ou serviços. Assim, deve-se organizar as visitas que serão feitas aos clientes e realizar as entrevistas que vão fornecer a informação essencial. Uma etapa preliminar importante consiste em gerar, nos colaboradores da empresa, uma atitude de escuta aos clientes.
Este primeiro passo pode-se dividir em quatro etapas:
1 - Definir os clientes a serem contatados
Os dados a serem coletados não são quantitativos mas sim qualitativos. Assim, escolher as pessoas certas é mais importante do que arranjar um grande número de clientes. Normalmente, bastarão de 12 a 20 pessoas para recolher cerca de 70% da informação mais importante.
Por outro lado, estes clientes devem ser representativos de:
· os diferentes segmentos de mercado
· o posicionamento face ao produto (satisfeitos; insatisfeitos; perdidos)
· o posicionamento face às tendências do mercado (precursores/pioneiros; atrasados; seguidores)
2 - Organizar a visita
Antes de começar, é necessário ter bem claro quais são os objetivos que se pretendem. Podem ser, em relação ao mercado:
· conhecer as expectativas dos clientes;
· recolher informação sobre a concorrência;
· acentuar o esforço de centragem no cliente.
Ou estas ações podem ter como objetivo compreender:
· Como são utilizados os produtos;
· Como funciona a distribuição;
· Quais os mecanismos de decisão por parte do cliente;
Quais os elementos que levam a fidelização do cliente.
É também preciso não esquecer o ponto essencial da escolha e formação dos entrevistadores. Estes devem ser colaboradores da empresa, não necessariamente da área do marketing, e ser bons ouvintes.
3 - Conduzir a entrevista
O ponto mais importante nesta fase é que o entrevistador não se deve guiar por um procedimento demasiado rígido mas manter o espírito aberto, coletar um máximo de informação, mesmo que não diretamente relacionada, aproveitar a sorte e também confiar na intuição. É importante recordar que a empresa não pretende tanto informações quantitativas mas sim qualitativas.
A conversa deve portanto ser orientada nesse sentido e ser cordial. O papel do entrevistador não é contradizer o cliente, mesmo que este não tenha razão, nem vender o produto, nem interrogar o cliente. É uma simples coleta de informações.
Refira-se ainda a presença do anotador: pessoa da empresa que assiste à entrevista e vai tomando notas. Isto evita a gravação da conversa, o que freqüentemente não é apreciado pelo cliente.
4 - Transcrever a informação recolhida
Uma vez efetuadas as entrevistas, é necessário arrumar e triar a informação, o que se faz em três passos:
· Escrever em etiquetas todas as frases verbalizadas pelo cliente;
· Desenhar as imagens descritas pelos clientes (esta fase permite identificar quais foram as ideias-chave mais importantes e selecioná-las) ;
· Construir um diagrama estruturado representando a voz dos clientes;
.Identificar as expectativas dos clientes.
Nesta fase, o importante é transformar a voz dos clientes, coletada através das entrevistas, em expectativas desses mesmos clientes. É necessário traduzir os desejos e opiniões desiguais dos clientes contatados em linguagem útil para a empresa. É preciso transformar as vozes dos clientes em necessidades e expectativas precisas, selecionar as mais significativas e apresentá-las.
Traduzir em expectativas
Neste sub-passo convêm levar em conta sete recomendações:
· Formular as frases negativas em afirmações positivas;
· Escolher frases que refletem o pensamento multiforme sem ficar presas a números;
· Escolher palavras específicas e concretas em vez de noções que podem ser interpretadas de várias formas;
· Exprimir necessidades e não uma solução concreta
(por exemplo, um equipamento);
Não entrar em pormenores mas exprimir o importante
· Utilizar os verbos no tempo presente ;
· Utilizar expressões concretas e não conceitos abstratos.
Freqüentemente, nesta fase, é necessário avançar através de aproximações sucessivas, não sendo possível chegar à formulação de objetivos finais logo à primeira.
Assim, é preciso:
· Selecionar as expectativas mais importantes ;
· Apresentar de forma estruturada as expectativas: é conveniente elaborar um diagrama, freqüentemente sob a forma de uma árvore de forma a ter uma visão de conjunto e a estabelecer uma hierarquia.
Analisar qualitativamente as expectativas dos clientes
Uma vez que foi efetuada a transposição das afirmações dos clientes em expectativas concretas, é tempo de analisá-las, de forma a ver se e como dar uma resposta apropriada. Para isto, cria-se uma série de indicadores. Estes têm por objetivo identificar quais são as funções dos produtos ou serviços a que os clientes dão mais valor ou importância, podendo considerá-las obrigatórias, atraentes ou indiferentes.
Para isso é necessário elaborar um questionário e submetê-lo aos clientes.
Este passo comporta várias etapas:
· Preparar um questionário: para cada exigência do cliente, é necessário criar uma questão que avalie a reação de cada cliente à presença ou ausência dessa função;
· Escolher os destinatários do questionário: estes devem ser representativos da diversidade de clientes;
· Preparar a aplicação do questionário: fazer cronograma, atribuir responsabilidades, explicar.
· Testar o questionário: repassar o questionário com duas ou três pessoas;
· Aplicar o questionário: enviar o questionário para os clientes e recolher as respostas ;
· Agrupar as respostas: em função da expectativa dominante ;
· Analisar as respostas: Esta fase inclui sessões de brainstorming para definir as especificações que podem satisfazer as expectativas dos clientes, a construção de diagramas, a análise das medidas.
Definir a estratégia do produto/serviço
A empresa dispõe, neste momento, de todos os elementos que necessita para tomar as decisões estratégicas, um conjunto de expectativas dos clientes e os indicadores que caracterizam essas expectativas.
Neste passo, é necessário:
· Construir o quadro da qualidade:
Este quadro é composto por uma matriz que combina as expectativas (as características que os clientes valorizam) e os indicadores (medições ou presença de elementos importantes) e que permite analisar como esses mesmos indicadores medem o que é de fato importante, ou seja, as expectativas dos clientes.
Na intersecção de cada expectativa com cada indicador é colocado um número que mostra se o indicador é uma boa medida para a expectativa.
· Focalizar nas expectativas estratégicas:
O quadro anterior permite identificar quais as expectativas mais importantes. Nesta fase, traça-se outro quadro que inclui as posições das empresas concorrentes. A análise da oferta da concorrência permite escolher as expectativas estratégicas.
· Formular a estratégia numa frase:
É sempre útil que cada estratégia seja formulada numa frase clara, compreensível para o cliente, e sempre que traduz uma orientação para o cliente.
- Precisar o conceito do produto/serviço
A última etapa do CEM - Concepção para Escuta do Mercado, não podia deixar de ser a escolha e definição de um ou vários novos produtos ou serviços a disponibilizar aos clientes.
Este passo pode dividir-se em três fases:
· Decompor e reagrupar
o Decompor a frase que define a estratégia em vários elementos
o Colocar cada idéia numa folha de papel, ilustrada por um desenho
o Escrever uma frase para cada desenho
o Gerar mais idéias a partir da frase, em grupos de dois
o Fazer a seleção
· Passar das idéias às soluções
o Identificar os conceitos e ideias-chave associadas à solução escolhida
o Definir novas soluções
o Fazer mais uma seleção
· Escolher a solução final
o Comparar as soluções com a orientação estratégica definida
o Comparar as soluções com as exigências da qualidade através de uma matriz que pondera as soluções em função das expectativas dos clientes.
Chega-se assim ao final do processo. Escolhem-se as soluções se estas forem ao encontro da estratégia definida no início e se tiverem todas as hipóteses respondendo às expectativas dos clientes. Não esqueçamos que este é o ponto principal que serviu de orientador a todo este processo: satisfazer os clientes.
E para isso, nada melhor do que ouvi-los.
A fase seguinte já não diz respeito ao CEM - Concepção para Escuta do Mercado mas sim às questões ligadas ao aprovisionamento de matérias e à fabricação (no caso de produtos novos) e à comercialização.
quinta-feira, 20 de setembro de 2007
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